15 de setembro de 2010

VELÓRIOS: TUDO PELO SOCIAL

Renè Magritte


    - Tais Luso  de Carvalho

São quatro horas da madrugada e estou acompanhada de uma boa insônia. Meu bloquinho está  à espera, na mesa de cabeceira, por umas ideias esdrúxulas que estão pintando na minha cabeça, quem sabe lá seja o resultado de programas que andei vendo e que não foram bem digeridos.

Lembrei de meu pai, era um homem que brincava com a morte, falava dela zombando, como  também lembrei do poeta Mario Quintana que chamava a morte de Minha Doce Prometida. E vieram a mim,  esses pensamentos  meio loucos a  essa hora da madrugada.

Não sou nada chegada a velórios, cemitérios e crematórios, gosto de sol e sorrisos, e isso não é muito próprio para essa ocasião, mesmo encontrando pessoas que há tempo não via.

E fazendo uma ronda mental pelos cemitérios fiquei pensando  no luxo e na grandeza da  Arte Cemiterial. Desde os primórdios que os humanos constroem templos luxuosos para esse fim. Há uma história muito rica em torno desse  assunto. Vale a pena pesquisar. As obras são belíssimas.

Mas falando nos tempos atuais, no velório de meu querido pai levei o maior susto: lá pela calada da noite, chegou uma enorme cesta para a família, cheia de guloseimas e chás, tudo enviado pela funerária. Logicamente recusei, não havia encomendado nada. Mas insistiram que era para esse velório, o do meu pai.  Então tá, que festa...

Tenho visto coisas inacreditáveis em velórios: no último que fui, a viúva colocou no caixão a taça preferida do marido junto com uma garrafa pequena do vinho que ele adorava. Num outro, que tive a honra de participar, foi colocado junto ao falecido, o livro A Metamorfose, de Kafka.
 Até hoje não entendo, tive de me segurar ao ver o Kafka sobre o mortinho. Lembro, também, de um pacotinho de folhas de arruda, colocado no caixão de meu tio, para espantar os maus espíritos... Poi8s é....  Fora os parabéns  que dão (enganado) para os parentes. 

E fora os grupinhos que se formam para matar as saudades da parentada distante, que não se encontram há anos!  É uma boa oportunidade de reencontro. Há mais espanto entre os que não se encontravam há anos, do que ver o defuntinho  ali, sem eira nem beira. 

Mas também não deixa de ser esquisito que eu esteja escrevendo tais coisas às quatro da madrugada, com a luz de cabeceira virada para a parede - para não acordar Pedro. O nosso cachorro, na porta do quarto me encarando como se quisesse me dizer  para apagar a luz e deixar a vida fluir... Acho que ele tem lá suas razões, na verdade, estou ansiosa para ver o sol raiar... e ver o colorido da vida.

Esse assunto não está muito confortável confesso, mas brotou a partilha!
Coisas dos humanos. 






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13 comentários:

  1. Tantas coisas acontecem nessas situações que dariam vários livros de tragédia e de comedia. Ótimo texto. Uma insônia que valeu.
    beijos

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  2. Realmente velório é mera reunião social. Quando morre alguém da família, não perco um, tenho a certeza que irei ver primos que a muito não via. E por falar em banquete, a minha família tem tradição e beber em velórios para honrar o falecido (só em velório e homem).
    Bjux

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  3. Dizem que morrer é ser esquecido. E ao que tudo indica esse processo inicia-se nos velórios.

    E nem vou relatar aqui o que já vi e ouvi sobre o assunto... Imagine se um conhecido lê meu comentário?!... rsrs

    Há quem afirme que existe a possibilidade da presença do espírito do morto durante o velório. Em muitos casos, isto seria o mesmo que pagar os "pecados" com juros e correção monetária. Nem bem o corpo esfriou e já estaria ardendo no fogo do inferno, obrigado a encarar uma realidade que sempre desconheceu, feita de interesse, hipocrisia, mentira, - toda sorte de máscaras que ali, agora na condição de espírito, lhe seriam reveladas... Credo!

    Excelente crônica, Taís.

    Bjs, amiga. E inté!

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  4. Estou meio sorrindo...ao pensar o que irão por no meu caixão, quando me finar..
    A Taís sai com cada uma!!!!
    Beijo

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  5. Demais esta crônica, Taís! Inspiração noturna daquelas, hein? Quase macabra!

    Pois é.... como dizia a música: os homens e seus velórios.

    O que mais me surpreende nessas ocasiões é a incapacidade humana de refrear sua sanha individualista. Vc já reparou? Tenho mil histórias de gente contando piadas num canto, enquanto o avô de um jaz geladinho aguardando que fechem a sua derradeira porta. Para vc ter uyma ideia, um primo meu, primo distante, quando minha mãe morreu, lá no velório, ficou puxando papo comigo, aos sorrisos animados, e em voz alta. Coisas do tipo: "Poxa, depois temos que armar de sair pra jantar!" ou "Minha mãe disse que vc gosta de vinho, legal, poemos sair para pegar uns cinemas com as mulheres e depois tomar uns vinhos legais, que acha?".

    Pois é, Tais, estamos mesmo sós.

    Bjos
    Cesar

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  6. Hahahah! Ah, Taís, com toda a modernidade e informação isso ainda mexe muito com a cabeça da gente. Eu tenho medo de ficar "perseguindo" velórios como herança genética. Meu pai mora no interior e não perde um sequer. Toda vez que eu ligo ele me conta qual foi o último. Minha irmã mais velha está indo pelo mesmo caminho. Eu, hein? hahahah! Esta semana vou postar um textinho sobre um velório em que fui ter com os desafetos. Eu lhe aviso. Um abração. paz e bem.

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  7. No mundo que vivemos não há espaço para o pensamento futuro. E o futuro o que é, se não o que diz sua crônica. Parabéns pelo artigo.

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  8. rsssss...muito legal e verdadeira tua crônica.Eu nunca me diverti tanto num velório como no do meu sogro.

    Não por ele,credo, mas pelos encontros que tives com minhas amigas de colégio que lá estavam...

    Rimos como loucas e nem lembramos do coitado.

    Pra culminar,chega uma coroa daquelas com flores de alumínio( do tempo do EPA) e seria a última coisa que o pobre homem,após ter trabalhado sua vida numa grande empresa,poderia imaginar de ganhar após a morte, como "presente".

    Um horror!

    Adorei te ler e me empolguei,rsrs beijos,chica

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  9. É com grande carinho que estou novamente aqui, para deixar que meu pensamento voe e meu coração se encante. Beijos querida.

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  10. De uma momento q todos nós viveremos fizeste um texto com humor e mt criativo.
    A morte é certa,e pq então é tã o dolorida para nós?nunca estamos preparado...
    Tais, fiquei imaginando a carinha do teu cachorro.
    O q a insonia fez de positivo, foi este belo texto.

    Um dia tu deixaste no meu blog um convite para ir no blog do teu amigo, não consegui ir no dia, e como não anotei, não sei o endereço, caso lembres,me passe, irei lá.
    bom feriado e mts inspirações eu te desejo.

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  11. Pois é menina, há pouco (na segunda semana de setembro), por pura coincidência, fui a 2 velórios.
    Na segunda feira, da irmã de um amigo, e na sexta feira, do cunhado da minha irmã.
    Realmente é muito estranho quando você passa muito tempo dentro de um velório, pois as mesmas pessoas que, no início estavam bem sérias e compenetradas, com o passar do tempo, já se esqueceram do morto, já estão contando piadas (e algumas até se segurando prá não rir muito alto).
    É a vida... fazer o que?
    O que morreu é o que está dentro do caixão, o restante está vivinho da silva, e dando graças a Deus de não ser ele o anfitrião da festa.

    Parabéns pela crônica, que como sempre, está perfeita.

    Jinhos

    Cid@

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  12. Taís... este assunto é esquisito - sou do tipo de pessoa que vou a vrlórios se puder ser útil, ou se sentir no coração; sabe que acho mais estranho de tudo é que hoje as familias abandonam os defuntos trancados nas capelas, vão para casa e aparecem as mulheres lindas para o enterro e as vezes os bens já estão destribuídos, e o corpo como dizem nem "esfriou" , quanto as comidinhas,rs,rs,rs bhá! Sou gaúcha "laá" de fora onde se servia canja, sopa para matar a fome dos que chegavam de muito longe.

    Chega deste papo brabo e muita vida e saúde para você e todos que por aqui passarem.

    bjs

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  13. Boa tarde querida Tais.. sempre com abordagens certeiras..
    não tiro nem as vírgulas do que tu escreve pois me encaixo na linha de pensamento..
    embora eu muito escreva sobre morte eu não era e nem sou fã de ir aos mesmos..
    pois quando eu era novo perdi uma prima de acidente mais a familia toda da amiga..
    não foi muito legal ver todos daquele estado.. enfim.. anos mais tarde meu melhor amigo se foi tb.. ele vivia na cadeira de rodas desde os 10 anos eu era o melhor amigo dele.. desculpe se já falei sobre isso em outro comentário rsrs tvz sim mas então.. eu vivia mais lá com ele conversando e deixando ele alegre do que em casa...
    um certo dia bateu uma pneumonia e uma semana depois ele partiu.. me neguei a ir ao velório .. muita gente que nunca visitou ele foi.. incluindo colegas nossos de aula...
    vai lá fazer o que né.. se despedir de quem já foi e tá se lixando para um bando ao lado do caixão fofocando..a gente faz em vida.. em morte é parente como vc disse.. que tu nunca viu na frente.. é o primeiro a chegar e levar flores.. e colocar o nome que lá esteve srsr
    muitos vem só pra filar umas comidinhas e se embugar de café.. a familia deste meu amigo pode não ter gostado.. mas fiz mais por ele em 15 anos juntos do que alguns que lá estiveram pra deixar coroas com seus nomes claro.. pra constar nos autos do velório..
    bem.. 15 dias depois foi minha nona pra outro plano.. dai sim me tocou ir.. encarei o tla velório e lá vi.. meus primos com seus nomes nas coroas.. coroa que quem pagou foi minha própria nona falecida.. a conta veio ao meu pai dias depois.. que arcou com todos os gastos.. não pagou nada do bolso dele pois o dinheiro que deu para o velório ele foi economizando em 10 anos um pouco por mes.. pq sabia que os irmãos nunca iam dar um puto nem para o caixão.. virei a noite no velório.. o meu primo mais rebelde chegou lá de punhos cerrados.. se nãoe stavamos lá acho que ia bater no meu pai pq o pai por não ter condições e o pai deles mais a outra irmão não ajudarem se obrigou nos ultimos dia a por a nona numa clinica e ele não aceitava e tal.. mas na hora de cuidar ele não cuidava... eram meus pais que tinham que ir lá dar banho na nona.. trocar as fraldas e tal.. sabe como é né.. não sou de chorar.. não derramei uma lágrima.. a gente faz em vida.. esses que muito choram é só pra comoverem os outros incluindo o prefeito que lá esteve não sei pq e os vereadores rsrs tudo farinha do mesmo saco.. é uma piada.. a respeito do kafka.. é um excelente livro.. mas cada uma né srsr onde que morto vai folhar livro e tal.. tem cada um sem noção srrs morto que mais vazar logo do inferno terreno srsr inclusive sempre muito muito fã da marcha funebre... fiz soneto a ela.. e meu primo que toca piano tá ferrado pois já disse pra ele.. cara.. no meu velório tu vai vir lá tocar a marcha funebre e que tenha bolo e cafezinho aos presentes.. quero festa rsrs não um bando fingindo e chorando sobre mim rsrs .. acho que não viste este soneto ainda.. vou deixar link aqui srrs

    http://lapidandoversos.blogspot.com.br/2014/02/velorio.html

    beijos e um lindo dia até sempre querida amiga

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Muito obrigada pelo seu comentário
Abraços a todos
Taís