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Obra daqui: Das Artes |
- Tais Luso de Carvalho
Ontem, com tanta coisa para fazer, andando meio pensativa, olhando para tudo e não me detendo em nada, apressei o passo para pegar o sinal aberto aos pedestres. Mas logo em seguida senti uma mexida na minha bolsa... Era aquela conhecida chata, brincando de assalto, tentando se passar por ladrão de celular! Foi a alegria mais falsa no encontro, e com dois beijinhos... Mas aprendi a aguentar uma pessoa chata e inconveniente, elas têm muita serventia.
Quando alguma coisa me aborrece, o encontro com pessoas assim, tem seu valor, elas me levam a muitas reflexões, e ao desgrudarem me deixam a sensação de que a vida é maravilhosa. Fica em mim a dimensão exata do que é a paz.
Uma das coisas mais difíceis não é pensar em me atirar de paraquedas ou despencar de Asa Delta; é conversar com criaturas chatas! Elas grudam em você, lhe pegam no braço, lhe tocam no ombro, empurram, cutucam e cospem! O chato fabrica muita saliva pela ansiedade de ter nossa atenção e parte de sua saliva nos atinge. O chato é íntimo - sempre! Tenho a sensação de que vou explodir. E já começo a me coçar. Fico impaciente com uma pessoa chata, e se for muito festeira a coisa piora. A saliva e as cutucadas se multiplicam.
É triste encontrar essas pessoas num carnaval de salão: elas pulam e se sacodem em cima de você! Querem enturmar na sua mesa e ficam numa euforia inigualável. Muita alegria incomoda.
Chatos são simpáticos demais, despejam emoção e alegria na medida errada: é aquela criatura que faz um berreiro num velório, é íntima do defunto. Parece que gerou aquele defuntinho. Ainda não descobri qual a razão da coisa. Mas essa gente precisa mostrar suas emoções. A pessoa chata não opina, ela impõe suas ideias. E aos poucos a gente vai enlouquecendo, pois nunca acertamos em nada!
Essas criaturas sabem de tudo: se começamos a falar em viajar, estão prontas a fornecerem o roteiro. A mesma coisa acontece com filmes, restaurantes etc. O ponto triste dos chatos é parecerem uma enciclopédia, conhecem tudo! São rivais do Google! E deixam em nós – por pouco tempo que seja – uma sensação de ignorância.
Dias atrás, comentei com uma chata, que gosto de escrever em silêncio, música me tira a atenção...
– Credo... você é parente de Matusalém? Tem de se modernizar, amiga! Isso é muito desagradável. É uma invasão na vida dos outros.
Fiz força para ser educada, tudo o que dissermos, essas benditas criaturas discordam: elas têm uma neurose em contestar, uma outra opinião sobre tudo na vida. Serão bem quistas num meio familiar ou social?
Não sei a razão, mas quando encontro alguns chatos, velhos conhecidos, quando eles começam a contestar tudo que o falo, alguma coisa se apossa de mim, e me vem a ideia mais primitiva do ser humano! Pois é… Mas não tem perigo, sou da paz.