Amsterdã |
- Tais Luso de Carvalho
Foi um dos dias mais tristes de minha vida: dia chuvoso em Amsterdã, capital da bela Holanda (países Baixos). Um país lindo, cheio de tulipas, diques, moinhos, bicicletas e com uma arquitetura belíssima. Terra de Rembrandt, Vermeer, Van Gogh… Ah, Holanda!! Poderia ter sido lindo, mas não foi.
Uma família sem muitos recursos, morava num barco: pai, mãe e um filhinho de 3 anos. Apesar de viverem com muita dificuldade, pareciam felizes. Tinham sonhos. Acreditavam em dias melhores. Eram brasileiros que foram viajando sem rumo certo, tentando um caminho mais feliz para viverem. Com as economias, que levaram do Brasil, compraram um pequeno barco. E aportavam um dia aqui, outro ali, sempre à procura de emprego.
O barco tinha um fogãozinho, pequena cama, mesa, tudo organizado para dar a ilusão de um lar, o sonho do casal. Até guardanapos de croché tinha. Todos os dias, em meu caminho, eu parava e falava com Jane, dava uma olhada na criança, levava algumas coisas para eles. Sentia lá, minhas raízes de brasileira.
Porém, um dia receberam uma notificação de que não poderiam continuar onde estavam: lá - onde ancoraram -, não era lugar para residência. Sei lá, eu não estava a par das leis, do permitido naqueles canais de Amsterdã. Mas senti o desespero do casal.
No dia posterior à notificação, Nando, o marido de Jane, saiu para ver como faria, para onde iria com a família. À tardinha passei para ver o que Nando tinha conseguido, como tinham ficado as coisas por lá. Jane, sem parentes, sem amigos, abraçou-me e desabou num choro compulsivo. Afeiçoei-me muito àquela família, Jane era como uma irmã. Trocávamos experiências, conselhos e afetos. Difícil lidar com a saudade. Apesar dos pesares, somos um povo sentimental, coração mole e solidário. Somos latinos. Quando consegui falar, perguntei à Jane o que tinha acontecido para aquele desespero. Estranho aquilo, nunca a vi assim!
Deu-me para ler uma carta de Nando; uma carta de despedida; não voltaria mais para o barco e nem para a família. Tentaria sobreviver noutras bandas. Cada um que seguisse sua vida. Simples assim, uma carta pesada, cruel e sem muitas delongas.
Mas então? O que seria de Jane, sem o marido, com filhinho pequeno, sem dinheiro, sem emprego, sem lugar para o barco, e num país que não era o seu? Como eu poderia ajudar Jane e Ricardinho? Ficamos abraçadas chorando; chorando pela falta de tudo, pelo futuro impreciso e solitário, pelo desconhecido e talvez pela nossa separação. Não estava achando solução, eu morava na Casa do Estudante.
Que destino estaria reservado para minha amiga, que apesar de pobre não tinha mágoas da vida, me confortava quando batia a saudade do Brasil. Aquela amiga que me convidava para o almoço, comer o pouco que tinham nos finais de semana. Eu precisava fazer algo! Debatia-me entre tristeza e ódio.
O relógio despertou às 7h e acordei! Uff... que noite de cão! Meu maxilar parecia de um cão Pitbull! Acordei tensa e com uma incrível enxaqueca. Qual a razão desse meu estúpido pesadelo? Não quero nem saber.
Mas, quero contar que eu nunca estive em Amsterdã; nunca morei na Casa do Estudante, nunca tive uma amiga chamada Jane, e jamais vi um barco vagueando pelos inúmeros canais de Amsterdã!
E muito menos conheci um cretino chamado Nando.
Imagem: daqui.
Thanks for sharing. Have a good day :)
ResponderExcluirPrezada Thaís,
ResponderExcluirVocê me fez focar todo o caminho e então você acordou do seu pesadelo! Felizmente não era real – que horrível.
Abraços,
Mariette
Boa noite de Outono, querida amiga Tais!
ResponderExcluirFui lendo avidamente, prendeu a atenção sua crônica, como sempre.
Ainda bem que era um pesadelo.
Há sonhos que se transformam em pesadelos e eu não esperava ser um porque histórias assim existem espalhadas pelo mundo onde os cretinos dos Nandos estão em voga mais do que nunca e nem ligam para os estragos na alma que fazem.
Interessante, Tais, hoje cedo, estavam dois motorhome estacionados pela orla e um deles dizia assim: cuidado, vicia! Achei interessante. Realmente, a ânsia de liberdade pode viciar e atropelar corações, como fez o cretino acima.
Gosto de ler algo que tenha a ver com meu dia assim coincidentemente.
Tenha dias abençoados!
Beijinhos
Olá, amiga Tais,
ResponderExcluirCuriosamente, quando li o título da crónica, pensei que era de facto uma sua vivência. Mas, com leitura, verifiquei que não passou de um sonho, de pura imaginação criativa. Que, poderia ter de facto acontecido.
Parabéns, por este excelente texto!
Votos de um excelente fim de semana, com muita saúde.
Beijinhos, com carinho e amizade.
Mário Margaride
http://poesiaaquiesta.blogspot.com
Taís, eu já estava penalizada... Ainda bem que foi sonho, mas dá pra imaginar quantos e quantos nessas situações se encontram,não?
ResponderExcluirLinda crônica! beijos, tudo de bom,chica
Que narrativa, Taís. Criou uma atmosfera que, se quiséssemos nos livrar dos canais de Amsterdam, de Jane e companhia, não conseguiríamos. Ficamos atados à bela história, e dispensamos Freud. Basta a força da sua narrativa.
ResponderExcluirUm beijo, minha amiga!
Que maravilha Taís. Você com arte nos colocou na calçada com olhos úmidos a olhar o barco, a família desamparada e ainda sentir o lado vil de muitos homens diante das dificuldades. Pude fazer rápida reflexão de tantos brasileiro que estão perdidos por países estranhos a procura de uma sobrevivência e muitas vezes maltratados por ignorarem as leis.
ResponderExcluirMas com igual arte nos tirou da calçada e nos levou ao riso e alivio.
Um show amiga.
Feliz fim de semana para vocês.
Beijo de paz.
hola Tais maravillosa excursión por los canales de Amsterdan ...que da paso a los
ResponderExcluirescelentes y sabios consejos que nos dejas como precauciones en nuestras visitas
, como nos cuentas hubo de todo pero lo mas importante es que puedas contarlo
tan magistralmante, una bella cita para siempre dentro de nuestras retinas eso es lo
que mas vale ....Tais feliz fin de semana a todos ...vueetro amigo , un abrazo . jr.
Existem pesadelos tão reais que acordamos em lágrimas. Felizmente que foi apenas um pesadelo. Mas Existem,infelizmente, histórias reais que são verdadeiros pesadelos. Feliz fim de semana...com bons sonhos.
ResponderExcluirAo ler-te, meti-me dentro da história e, solidariamente, sofri. Sofri o teu sofrer e sofri quanto aquela família sofria.
ResponderExcluirFelizmente o teu "sacão" de que nunca estiveste na Holanda, também me acordou. Ainda bem que era só um pesadelo de sonho!
Parabéns por mais esta Crónica de Humanidades.
Beijo
SOL da Esteva
Muito bom!
ResponderExcluirTais, triste demais
ResponderExcluirEsta crónica
vai-me ficar na memória
Bom fim-de-semana
Barbaridade! "E agora, José?"! E essa agora?
ResponderExcluirBom dia, Taís. Depois, você e o Pedro dizem que eu é que "apronto" no final, levando todos a se enganarem com o desenrolar da história... rsrs.
Mas, minha amiga, mesmo apesar de cair da cadeira com o final, tem muitas coisas a serem comentadas aqui. Primeiro, a Holanda é um sonho para mim. Gostaria muito de conhecer. Segundo, a admiração que tenho pela coragem de pessoas que se atiram a um universo que não é o seu, para trabalhar, estudar, ou meramente por aventura. Quando se tem dinheiro, tudo bem, mas quando não se tem, haja coragem. E, finalmente, o traste, o cafajeste, o canalha (como você bem disse) do marido e da atitude que tomou. Por sorte era um sonho, mas quantas mulheres são abandonadas, largadas ao léu juntamente com os filhos, pelo companheiro? Mulheres que, não raro, acabam se prostituindo ou parando em meios criminosos, isso para poderem se sustentar e aos filhos? Esse é um assunto delicadíssimo, e que deveria ser discutido amplamente e, depois, serem tomadas medidas enérgicas e severas.
Ótima e oportuna crônica, Taís. Grande abraço e um lindo fim de semana pra ti.
Marcio
Una bella historia, que hace llorar a cualquiera. Quizás esa lluvia abundante, te ha llenado de melancolía.
ResponderExcluirBesos.
Mejor que haya sido un sueño, aunque de esos sueños está el mundo lleno de historias y de tristes realidades que se hacen más dramáticas cuando ocurren lejos de tu tierra. Probablemente, exista una familia que aun con distintos nombres lleven las penurias de tu triste relato.
ResponderExcluirUna emocionante y triste historia narrada con tu buen hacer amiga Táis.
Un gran abrazo y feliz fin de semana con alegría y paz.
Tais, me has emocionado amiga, con esta bella historia, menos mal que solo es un sueño, pero desgraciadamente es una realidad. Toda pesadilla tiene un porqué. Genial Tais, me ha gustado leerla dentro de su tristeza. Un abrazo
ResponderExcluirUna historia muy conmovedora que llega al corazón.
ResponderExcluirPodría ser muy real pero tranquiliza pensar que haya sido un sueño.
Una gran historia.
Un beso.
Olha Taís, só não entrei no barco contigo, porque fico nauseada, mas acompanhei espiando de perto a angústia da família, o seu envolvimento que nos envolveu também! Uma arte conduzir a escrita assim.
ResponderExcluirBeijo
ana paula
Hay pesadillas que son muy vividas. Me gusto el relato. Te mando un beso .
ResponderExcluirainda bem que nao era real desejo tudo de bom feliz domingo saude
ResponderExcluirFoi um pesadelo, minha Amiga Taís. Mas quantas histórias assim não acontecem? Parecia tudo tão real não só porque está muito bem escrita, mas porque no mundo multiplicam-se os casos de imenso sofrimento iguais aos que descreveu.
ResponderExcluirMuita saúde.
Um beijo.
Confesso que fiquei muito triste e pensando qual seria a solução, mas, o bom é que foi só um pesadelo.
ResponderExcluirComo sempre Taís, bela e muito bem criada a tua crônica. Parabéns!
Abraços e um ótimo domingo para ti e para os teus.
Furtado
¡Ah! ¡Qué pesadilla más fea! ¡Menos mal que sólo era un mal sueño! Besos, querida tais
ResponderExcluirInfelizmente há Nandos neste Mundo.
ResponderExcluirE são muitos.
Cobardes e irresponsáveis.
Beijo, boa semana
Como diz o Pedro e estou de acordo, infelizmente há muitos Nandos neste mundo.
ResponderExcluirUm abraço e boa semana.
Andarilhar
Dedais de Francisco e Idalisa
Livros-Autografados
Por un momento pensé que la decepción sufrida en Ámsterdam era por el clima.
ResponderExcluirEl relato me ha parecido magnifico e incluso creíble ya que los latinos somos así.
Saludos.
Olá, amiga Tais,
ResponderExcluirPassando por aqui, relendo esta excelente crónica que muito gostei, e desejar uma feliz semana, com muita saúde.
Beijinhos, com carinho e amizade.
Mário Margaride
http://poesiaaquiesta.blogspot.com
Olá Taís
ResponderExcluirFicou tão bem escrita sua crônica que eu jamais suspeitei ser um sonho...ou melhor, pesadelo como você bem disse.
Como muitos aqui falaram nos comentários, isso acontece muito no mundo atual e é muito triste, Há sonhos que parecem realidade.
Muitos maridos abandonam suas esposas e filhos e o deixam na pior situação.
É uma pena, muito triste abandonarem não só uma família mas toda uma vida, uma responsabilidade.
Que bom que era um pesadelo e não realidade, amiga.
Abraços e boa semana.
AMIGA TAÍS
ResponderExcluirpela primeira vez que me senti enganada com uma das suas crónicas
eu já sofria ao ler e sempre me lembro das crónicas que escreve da vida real, por isso lia e sofria acreditando em tudo, a descrição era perfeita, mas...
que pesadelo terrível, Jesus!
Fico pensando que eu não sonho mas se sonho nunca me recordo dos sonhos, felizmente...porque lembrar de um pesadelo destes é demais, minha Amiga Taís
Muita saúde.Um beijo da Tulipa
Tenho posts novos, aqui:
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e, aqui:
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Comovente, Taís!
ResponderExcluirPor vezes, os sonhos talvez nos pretendam despertar para algumas realidades que podemos encontrar na nossa vida diária, sei lá!
Beijinhos e, desde já, votos de Boa Páscoa!
Querida Tais, há histórias que se leem e não se esquecem. Esta, brilhante e com um final surpreendente, é uma delas.
ResponderExcluirAplaudo a escolha do tema, a construção da narrativa, a leveza e beleza da tua escrita.
Multiplicam-se as histórias de famílias que buscam em terras estranhas e longínquas melhores condições de vida. Infelizmente, multiplicam-se os finais tristes.
Beijo, querida amiga cronista enganadora.
(“Na vida não temos só sonhos ou só pesadelos, a alternância entre ambos é que faz a realidade.” – Charlie Chaplin)
Fiquei feliz ao saber que era um pesadelo...
ResponderExcluirInfelizmente, existem muitos Nandos!
Forte abraço, querida amiga
Que magnífico relato, Taís.
ResponderExcluirLo he seguido con enorme atención, sufriendo a la vez que tú, por la suerte de Jane y el pequeño niño.
Y de repente, me he despertado contigo, muy disgustada con el gilipollas de Nando.
Abrazos.
Olá, amiga Tais,
ResponderExcluirPassando por aqui, para desejar um feliz fim de semana, com muita saúde.
Beijinhos, com carinho e amizade.
Mário Margaride
http://poesiaaquiesta.blogspot.com
Bom dia Taís,
ResponderExcluirQue Crónica esta, hein!
Li de um fôlego e fiquei sem palavras.
Foi um terrível pesadelo, mas quantos casos como esse não existirão por esse mundo afora.
Dá que pensar esta sua excelente Crónica!
Beijinhos e bom fim de semana.
Ailime
Relendo, revejo o pesadelo (agora com alívio) que, verdadeiramente te preocupou.
ResponderExcluirTe saúdo, Taís.
Beijo
SOL da Esteva
um lindo e feliz fim de semana bjs saude
ResponderExcluirOlá, Taís!
ResponderExcluirPor sorte tudo não passou de um pesadelo. Muito bem construído, parabéns.
Fico pensando na multiplicidade de casos como esse que acontecem mundo afora. Tem gente que a própria vida é um pesadelo... é... a vida não é igual para todos.
Tenha um ótimo fim de semana... sem pesadelos, rs.
Bjs
A mente às vezes nos prega partidas bem curiosas... lembro de um sonho que tive há bastante tempo, em que me despedia do meu irmão... A piada é que sou filha única... e quase nunca lembro do conteúdo dos meus sonhos... e no entanto pedacinhos daquele sonho , ainda hoje me continuam gravados na memória... porquê? Acho que jamais saberei! Talvez memórias de vidas passadas...
ResponderExcluirAdorei o seu fantástico texto, Tais! De leitura imparável, até à última linha...
Beijinhos! Feliz Páscoa!
Ana