28 de junho de 2010

LIVROS DE AUTO-AJUDA


- Tais Luso de Carvalho


Tenho na agenda doméstica os telefones do eletricista, do encanador, pintor, médicos, dentistas... E o do colocador de papel de parede, o Adão. Muito bom colocador, mas quase me mata: não fala, não sorri, não escuta e não olha quando fala conosco. Seu olhar fica zanzando no espaço.

Meu marido diz que o coitado é tri de tímido; eu acho que ele é tri de doido. Mas são duas opiniões, e aqui em casa o negócio é democrático: então o doido e o tímido - dois em um - continua trabalhando por aqui, porque seu trabalho é nota 10.

Com este caso do Adão e sua personalidade sui generis , lembrei que há muitos anos andei lendo uns livros de auto-ajuda, estava na moda: fiquei fascinada com os assuntos: Como ficar rico sem fazer força; Como fazer centenas de amigos; Como ser a pessoa mais agradável do mundo; Como lidar com mentirosos; Como lidar com pessoas depressivas; Como curar sua timidez... E li alguns. Um deles até gostei: Como fazer amigos e influenciar pessoas, de Dale Carnegie.

Mas adorei o que aconteceu comigo: absolutamente nada! Continuei a mesma pessoa que sou hoje. Não aprendi a lidar com mentirosos e nem com depressivos; não aprendi a engolir presunçosos; não consegui fazer centenas de amigos e nem me tornei a pessoa mais agradável do mundo... E também não fiquei rica. Comigo tudo deu errado, o negócio não funcionou. Pelo contrário, acho que fiquei um tanto rebelde diante de certas coisas, e até hoje solto a língua...

Hoje, já bem mais madura, não teria saco nem curiosidade para ler um livro de auto-ajuda. E lá se foram bons anos de minha vida querendo mudar coisinhas num vapt-vupt. Não dá mais pra desfazer o que foi lido... Já prescreveu!

Ninguém muda de uma hora para outra folhando um livro desses: muda-se quando se tem a conscientização do problema e a vontade de mudar. Em certos casos podemos mudar com alguma ajuda química (se for o caso de depressivos, etc.) e uma terapia com profissional confiável.
.
Nossa carga genética já vem pronta; porém, nossa trajetória, nosso amadurecimento, nossas experiências, o meio em que vivemos e com quem vivemos é que poderão alterar alguma coisa em nosso comportamento. Mas tem coisas que não mudamos: quem tem um coração piedoso sempre o terá; quem tem um ótimo caráter sempre o terá; e quem é cafajeste, sempre será. E com a idade pioram, pois os cafajestes também envelhecem, ficam uns velhinhos tão coitadinhos né?! Aparecem uns por aí que dá vontade de mandar para o espaço...

Bem, mas voltando aos livros de auto-ajuda, ganhar dinheiro fácil é um engodo; lidar com pessoas falsas ou de difícil relacionamento é pegar sarna pra se coçar; depressão, timidez, bipolaridade são problemas para especialistas. Então não adiantam estas lindas mensagens por Internet ou livros que prometem uma vida melhor e tentam nos mostrar um campo fértil para ser feliz.
Para certas situações de estresse contínuo, o negócio é se mandar antes que você tenha um AVC! Por que depois disso, amigo, o negócio muda completamente. Foi-se sua vida: você fica todo torto e a vida continua linda e bela – para os outros.

Pena que a gente leva a metade da vida para aprender que a felicidade está em nós, e não nos outros; pena que nos metemos na vida das pessoas sem elas pedirem, com a desculpa de ajudarmos, quando na verdade, queremos que o outro seja nossa imagem e semelhança.

No fundo, não temos nada de coelhinhos ou de beija-flores... Temos sim, unhas afiadas, uma língua comprida - boa pra fofoca -, uns olhos que vêem o que não acontece; uns orelhões que escutam o que nunca foi dito; um coração petrificado em relação aos outros; e uma idéia já formada para atingir nossas metas. Adiantam os auto-ajudas?

Enfim, somos o lobo-mau, mas com pele de cordeiro, com a intenção de enganar o chapeuzinho vermelho.

Mudar é suar a camiseta a vida inteira: suor e lágrimas!!



21 comentários:

  1. Tem toda razão. Assino embaixo.
    Belo texto, bem desenvolvido e gostoso de ler.
    beijos

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  2. Olá Tais!

    Mais uma crônica brilhante e realista!

    Fui lendo e lembrando de todos os livros que você mencionou, conheço e reconheço o teu sentimento de inutilidade em relação aos mesmos.

    Também não aprendi a lidar com mentirosos nem com gente safada!
    Eu devo ter um defeito de fabrica, abomino pessoas falsas e mentirosas.
    E não acredito em mudanças!!!!!!

    Quem é assim, será assim sempre!

    Não acredito em teorias nem em frases de efeito. Só acredito em fatos e atitudes!

    Tenho visto cada coisa por aí... coisas que até Deus duvida! Misericórdia!

    Como dizem os meus amados gaúchos.. "Barbaridadeeee tchê!"

    Beijos

    Lia♥
    Blog Reticências...

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  3. Taís, vir aqui é sempre um prazer. Minha história com a auto-ajuda é engraçada. Quando eu vim morar em BH para estudar (há mais de 30 anos), foi morar um cara na nossa republica que não tirava das axilas o livro "Como fazer amigos e Influenciar Pessoas". Só que ele era de muito poucos amigos e influenciar, jamais! Tanto que o expulsamos de lá. Naquela época nem se chamavam de auto ajuda ainda esses livros. Então fiquei com trauma desde já. E por ironia, que mais parece um castigo, eu escrevi um livro A VIDA DO BEBÊ, um ensaio que trata da vida depois dos 40, uma crítica e uma reflexão sobre a maturidade e qual não foi a minha surpresa ao conferir no site da editora, ele está classificado como de auto-ajuda. ai, que raiva! Abraços.Paz e bem.

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  4. Tentando disfarçar este 'lobo-mau',
    até deu para sorrir com essa bela descrição. Maravilha...adorei. Mas é
    assim mesmo,já passámos por uma situação ou outra e não difere....nada de coelhinhos ou......

    Beijo

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  5. Bom dia, Tais.

    Adorei, concordo integralmente, só que nunca li nenhum, apesar de não ter preconceito com livro algum e leio até bula de remédio o tal minutos sabedoria que também foi moda me irritava. Muito boa a crônica como sempre divertida e um tantinho lobo mau.

    Beijo

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  6. Rs.
    Seu Adão deve ser uma figura.

    Assim como você, não gosto de livros de auto-ajuda, mas no meu caso sempre tive repulsa.. Não gosto. Ainda assim, depois de torcer o nariz para todas as ajudas milagrosas que me relatavam, resolvi me render a dois: Quem Mexeu no Meu Queijo, clássico e Não Faça Tempestade em Copo D'água. De ambos, a única coisa que consegui extrair foi superficialidade. Acho muito ousado fazer um manual e tentar empregá-lo na vida das pessoas, sem ao menos levar em conta a vida delas. Como se a vida fosse exata, como se coisas profundas pudessem ser ensinadas em massa.

    Num contrafluxo, extrair de obras avessas à auta-ajuda, lições maravilhosas, como Clarissa de Érico Veríssimo e O Caçador de Pipas de Kalhed Hosseini e por ai vai.

    Um abraço pro "seu" Adão, rs.

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  7. Eu sempre achei interessante essa expressão, - auto-ajuda. Ela é correta se a analisamos do ponto de vista de que, como você diz em sua excelente crônica, só
    quem pode nos ajudar é aquela pessoa cuja imagem vemos refletida no espelho.

    Vejo uma certa distorção da expressão. Livros de auto-ajuda?... Um diário, talvez, seja um livro mais eficiente de auto-ajuda. Relendo-o, pode-se repensar desejos, frustrações, atitudes passadas e, refletindo, talvez se consiga chegar a alguma luz. Não é impossível, mas dificilmente vamos encontrar no pensamento alheio algo que tenha um impacto significativo em nossas dificuldades pessoais.

    Para que a tal auto-ajuda se concretiza é preciso sobretudo muita fé em si mesmo, ou nada se resolverá.

    Outra coisa: no Brasil, segundo uma pesquisa que anda rolando por aí, cerca de 35 milhoes de pessoas compram livros. E aí vem logo aquela frase: "Nossa! O brasileiro está lendo muito mais!" Entretanto, tem-se que lembrar que são os livros de auto-ajuda e os best-sellers que estão no topo da preferências desses compradores...

    E é como você diz mesmo... No caminho da almejada solução há muito suor e lágrimas...

    Agora, Taís,... adorei também o sêo Aão e sua "síndorme" dos macaquinhos! Especialmente a história do "olhar zanzando no espaço"... rsrsrs

    Bjs, amiga, e inté!

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  8. Olá Tais! Eis que trazes mais uma bela e verdadeira crônica. Concordo plenamente com tudo o que abordaste. Afinal, pau que nasce torto, não tem jeito, morre torto.

    Beijos e ótima semana pra ti e para os teus.

    Furtado.

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  9. Gostei muito do blog, por isso que te indico ao Prêmio Dardos e ao prêmio Sunshine.
    veja as regras no meu blog =)

    http://ialydarc.blogspot.com/

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  10. Boa crônica, Taís! Ri aqui de imaginar o Seu Adão. Conheço alguns faz-tudo exatamente como ele... Pelo menos o seu Faz-Tudo é competente, conheço uns totalmente ineptos!

    Bem, quando comecei ler sua crônica, pensei: "depois que ler vou falar do livro do Dale Carnegie pra Taís". Não precisou, você o conhece. Sim, é o melhor de todos. Talvez o único bom. Escrito na década de 30, bem antes do termos auto-ajuda ser forjado.

    Aliás, muitos desses livros copiam o Carnegie descaradamente. Bem, isto posto, devo admitir que, sim, livro de auto-ajuda é mesmo um saco. Quem leu um, leu todos e, como você disse, não aproveitou nada.

    Lembrei-me de um adágio que vem bem a calhar:

    "Quando precisar de uma maozinha na vida, procure, primeiro, na extremidade do seu braço"

    bjão, Taís!

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  11. Olá Taís,
    Nunca li um livro de auto-ajuda.
    Penso: se eu não tenho capacidade de resolver meus problemas, eu que sou dona deles, não seria um estranho ou um livro que iriam resolver.
    Você sempre discorre com muita graça todo e qualquer assunto, adoro passar por aqui.
    Beijos
    Dalinha

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  12. De fato. Mudar o nosso comportamento é uma opnião subjetiva e ninguém de fora vai conseguir mudar, a menos que você esteja disposto a aceitar que o seu modo de vida é errado ou contraditório.

    Aceitar as imposições que complicam nossas vidas e as subjetividades errôneas que encarnecem o nosso ser é o primeiro passo para começar a mudar.

    Pois se não aceitamos os nossos erros, então não há o que ser corrigido não é verdade?

    Direto do Rio.
    Beijão linda. Eu sou teu fã.

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  13. Gostei muito do seu texto, Tais.
    Parabéns.

    Passe lá pelo meu espaço...

    Andreia

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  14. Taisamiga

    Livro de auto-ajuda? Tem de ser oferecido ao vosso Dunga e ao nosso Carlos Queiroz. E, depois, mandar fuzilar provisoriamente os dois. Este Mundial foi uma catástrofe em Português!!!!!!

    Mas, afinal, o Pedrão chama-se Adão?

    Abs ao Adão e qjs para tu

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  15. rsrs, HENRIQUE, o Adão é o colocador de papel de parede!!!

    Pelo amor de Deus, não faça confusão, não tem nada a ver com o Pedro Luso, rsrs.

    Creio que esta 'Copa 2010' te deixou meio confuso! Mas creio que todos vamos voltar ao normal...

    bjs.

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  16. Tais,
    eu acredito que todo esforço em busca de mudança é indesejável. Penso que se a mudança acontecer, acontecerá por si mesma: justamente naquele momento em que nos deixamos em paz. Não adianta apressar o rio. Ele corre sozinho. (li isso em algum lugar, mas não lembro onde. rs) Bjo e ótimo fim de semana.

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  17. Vejo em você tais o que falta em muitas pessoas, inclusive em mim. equilibro e sensatez. ótima crônica!!!

    Fica com Deus!!!

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  18. E depois ainda temos que lavar a camiseta! Oh, vida!
    Bjoo!!

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  19. Ler livros de auto-ajuda, Tais, é como cursar psicologia na tentativa de dar um jeito na própria cabeça - o que, aliás, é bastante comum.

    Mas devo confessar, hipocondríaco que sou, que leio compulsivamente a vertente mais pródiga em títulos da literatura de auto-ajuda: a das bulas de remédios. E tenho fé que hei de ler algum dia a obra-prima do gênero: a bula de um medicamento anti-hipocondria!

    Abraços

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  20. É o problema de pensarmos que somos iguais aos outros, e por isso formula que funcionou para outro, vai funcionar para nós e depois para o próximo, mas não é bem assim, pois cada pessoa é um universo de diferenças, mas como você disse, só a nossa própria vontade que mudara algo...

    Fique com Deus, menina Tais Luso.
    Um abraço.

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  21. nossa.... exatamente tudo que penso, incrivel,penso exatamente como vc mais nunca encontrei o conjunto de palavras que representa-se isso ...belo texto!

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Muito obrigada pelo seu comentário
Abraços a todos
Taís