Tais
Luso de Carvalho
Não
há dúvida que ao recebermos a notícia do falecimento de alguém
ficamos consternados, lamentamos
imensamente a perda. E uma dor mais intensa quando é familiar, a ficha custa a cair até nos
darmos conta que essa separação é para sempre. Sem retorno.
A
dor é enorme e a recuperação é muito lenta. Porém, certas
atitudes, que seguem ao sepultamento, surpreendem,
e servem para nos dar a
dimensão exata dos mais diversos comportamentos.
É muito comum que a princípio, se pense na pobre viúva (o) e nos filhos como mais um
dos tantos casos que passam pela nossa
vida.
Tudo
começa mais ou menos igual;
o ser humano é único. Após alguns dias
do falecimento do
ente querido, começam as doações das
roupas e dos seus pertences, distribuídos entre os familiares,
empregados e instituições. Tudo com muito pesar e lágrimas. Fotos
são inevitáveis: abre-se o baú e ali estão as fotos do
nascimento, namoros, noivado, das férias inesquecíveis, das bodas
de prata, de ouro e mil recordações. Revive-se, nesse momento,
situações há muito esquecidas. E lágrimas brotam oriundas de um
estado de consternação.
O
primeiro mês é um tormento, podemos
imaginar
a pessoa falecida em todos os cantos; sua poltrona predileta, seu
terço, seu livro de cabeceira, sua xícara. Até seu perfume. Cada
coisa é uma lágrima escorrida, tentando ser escondida. E antigos defeitos viram virtudes. Chora-se
ao olhar o computador
do falecido, suas
ideias ali postadas. Sentimos
ao ouvir suas músicas, ver seu celular, olhar
seus chinelos…
Seus pertences tornam-se algo penoso de suportar. Tudo tem uma
conotação afetiva e tudo permanece onde sempre esteve.
Passado
algum tempo, as coisas começam a trocar de lugar: a poltrona voa, a cama é substituída, os livros vão para o lugar certo, o
chinelo vai pra empregada e a sala toma outra aparência: tudo
trocado de lugar com a intenção de
renovação, pois é preciso dar prosseguimento à vida. Ninguém quer levar, por mais tempo, uma lembrança triste e constante. É
preciso amenizar o sofrimento. E todos
começam a falar do magnífico lugar que o falecido (a) deve estar. É um conforto. Muitas vezes, com essa atitude, procura-se o perdão por certos
entraves causados a quem se foi. A maioria até que consegue ajeitar
as feridas e soterrar as culpas.
Porém, também existe uma infinita e absoluta dor, que teima em ficar. Sim, existe, acompanhada de depressão e de difícil recomeço. São seres que se fundiram num só espírito, num só querer, numa só vida. Creio que esse amor é insubstituível, poderoso.
Porém, também existe uma infinita e absoluta dor, que teima em ficar. Sim, existe, acompanhada de depressão e de difícil recomeço. São seres que se fundiram num só espírito, num só querer, numa só vida. Creio que esse amor é insubstituível, poderoso.
Pois bem: passada a
dor inicial, entra uma outra realidade na família: a Partilha, divisão dos
bens! É neste ponto que o ser humano se mostra por completo. É aí que
começa a dureza da nova vida: as leis e os direitos: o meu e o teu;
o fifty-fifty fiscalizado e um advogado mediando os interesses das
partes. Começa o que antes nem se cogitava: as brigas dos herdeiros pelas coisinhas. Brigas por palmos de terra, desentendimentos por
porcarias.
E é nesse ponto que
acontece a nossa segunda perda: sepultam-se sentimentos, o respeito,
a amizade, a dignidade, o parentesco e a justiça. E tudo em nome de
latarias: de trecos e cacos. Começa a mesquinharia. Acaba a harmonia
e começa a desconfiança entre os herdeiros. Muitos deles verdadeiros horrores. A harmonia vai pro brejo. Para o fosso.
A morte física parece ser
um engodo, uma provação pra ver até que ponto pode chegar o ser
humano. Sordidez é algo que desqualifica, que depõe, que desmerece.
Mas é próprio da nossa espécie. A paz é essencial, e bendito seja
aquele que consegue ver que o importante é ter apenas o necessário.
O supérfluo é dispensável, e em muitos casos só serve para
magoar, pra separar, pra destruir. Partilhar deveria ser um ato
civilizado, feito em paz; mas é um confronto penoso. E sempre através da justiça dos homens.
Não sei onde fica o
paraíso, mas logicamente não é um lugar físico. Paraíso é estar em
paz e sem conflitos, um estado de espírito.
Até
hoje não entendo como a morte não consegue deixar seu recado; é
apenas percebida quando chega, quando busca a vida. Depois, é
esquecida, e tudo se repete, como se ela não fosse voltar…
E assim, ficamos vivendo o eterno ciclo da insensatez.
Lindo texto, Tais.
ResponderExcluirbjx
RF
Taís é bem verdade e eu que o diga pois a quase todos os dias lido com essas perdas, há dias ao fazer a cerimônias fúnebres de uma jovem de 28 anos chorei feito Criança, O que não iria no coração dos pais daquela jovem. gostei do teu texto.
ResponderExcluirBeijos
Santa Cruz
Limerique
ResponderExcluirPerdas, eventos próprios da vida
E quando se perde pessoa querida
Com divisão de bens
O desconforto vem
Muitas vezes em atitude suicida.
Um texto repleto de verdades. Feliz quem ainda em vida, doa e deixa doado o que tem usado por empréstimo. Aquele que sabe partilhar, faz seu "paraíso" no aqui e agora! Depois, para quê?
ResponderExcluirAbraço.
O culto à mesquinhez é feito hoje em dia com cuidado, muito cuidado. A partilha descrita também é encontrada nos casamentos desfeitos. No caso que vc descreveu há sempre um herdeiro levando vantagem e , sempre me lembra o filme Zorba o Grego..
ResponderExcluirTaís, ontem estive aqui, li e não entrou o comentário! Gostei muito e falaste exatamente o que acontece, tanto na hora da morte ,quanto após, nas partilhas. As amizades começam a mudar, interesses, baixarias, dá de tudo! Pena! beijos,chica
ResponderExcluirOi, Chica, não entrou comentário ontem?
ExcluirPenso que são coisas do próprio blogger. Essa minha resposta tá custando a entrar.
Obrigada, Beijos!!
Querida Tais, este post fez lembrar uma conversa que tive com uma amiga, onde ela dizia que não se preocupava em adquir coisas, tipo esse consumo desenfrado ou bens caros e duráveis, o motivo dela é simples, pra que deixar 'coisas' para que a família restante viva, acabasse por se matar na ânsia de ter tais bens...teoria dela, mas concordo um pouco. Na tua crônica praticamente é feita uma varredura rs sobre o assunto, porque para mim o que importa ou o que vai me pegar é justamente a perda, ninguém quer perder ninguém, eu nem me imagino imaginando a morte de mimnha mãe...Também lembrei de uma remota aula no curso de direito, há muito tempo, dizia um professor: no início da relação é meu bem meu bem, no divórcio vira meus bens meus bens...lendo tua crônica, agora é claro para mim o que minha amiga queria dizer, ela não quer que se repita a segunda perda, dita por ti, tão lúcido isso...muito bom estar aqui e participar de tão agradável bate-papo.´ps. Carinho respeito e abraço.
ResponderExcluirblog do jair ou histórias de músicas e pessoas
Desse tipinho Taís! Quando se perde um ente querido a dor é tão maior que a dor física, isso é, se o ente for mesmo querido... Há os que prantei junto ao corpo inerte e há os que contam piadas nos funerais e ainda reclamam da marca da água que foi colocada para matar as sede dos que velam o "ente querido".
ResponderExcluirSenti na pele isso e ainda sinto. Com o passar do tempo o pranto diminui, mas a dor ainda lateja quando vc lembra que a pessoa não estará mais presente em nada na sua vida. E os parente tentam adquirir direitos sobre os bens que ficam... Isso desmerece a pessoa que se foi, pois a gente começa a notar que não havia um amor verdadeiro, uma irmandade carnal forte. Por isso creio que a Bíblica diz que "há amigos mais chegados que irmão" já que amigos não tem mesmo direito à herança e já irmão, pode ter ou nao.
Você descreveu muito bem em sua crônica esse momento tão difícil e tão mesquinho na vida [ou na morte] de todo mundo.
bjkas doces e retornando, pois a vida continua e as coisas tem que se moverem, nem que seja o sofá da sala ou a cama de casal.[rsrsrs]
Oi, Marly, que bom seu retorno, você sentiu o que eu escrevi, o que lamento...
ExcluirDevagar você vai se reencontrando.
Beijo grande, meu carinho!
Sempre contende e verdadeira suas cronicas Tais, adoro.
ResponderExcluirhttp://apoesiaestamorrendo.blogspot.com.br/
Tais, querida, quanta verdade existe diante da morte e que você bem nos aponta!
ResponderExcluirParabéns por esse talento e visão de vida que Deus lhe deu!
Beijos, Vilma
PARABÉNS , pelo lindo blog, gostei de tudo aqui, estou te seguindo, esteja a vontade para conhecer Literatura Infantil.
ResponderExcluirBeijos
Taís, esse seu texto foi encomendado por mim sem você saber, rsrs. É bem isso que acontece mesmo, estou vivendo a última parte dele após a morte do meu pai há três meses, ai como eu queria que algumas pessoas pudessem ler cada linha escrita com tanta precisão por você.
ResponderExcluirMas vou lhe dizer também que todos esses momentos dependem da idade do falecido, quando perdemos pessoas muito jovens é sempre mais difícil, doloroso e pode trazer consequências fatídicas, depressão e outras doenças por exemplo. A fé, nesses momentos, é sempre um grande amparo e ajuda a consolar os entes queridos.
Beijos
Sei disso, Néia! É penoso. Morre um pedaço da gente, principalmente um pedacinho da nossa infância. Já perdi a dupla: pai e mãe. Mas a gente sai, a recuperação vem aos poucos embora as lembranças se tornem suaves e sempre boas. Tudo vai indo para os lugares certos...
ExcluirMeu carinho pra você.
bj.
Tais, nunca perdi pessoas muito próximas. Na verdade, uma só, a minha bisa. E como teu texto exemplificou, a partida dela seguiu esses mesmos passos. Minha avó nunca foi materialista, não ligou pra repartição de nada. Fez questão, apenas, de recolher coisas simples que gostaria de ter com ela como um quadro que ficava na parede e os óculos de sua mãe. Quando venderam a casa, foram os filhos dessa minha avó que pegaram a parte dela, por ela. Porque viam a necessidade de ela ter aquele dinheiro para promover alguma reforma que quisesse fazer em sua casa. Ela nunca se mostrou intencionada por nenhuma parte, mas aceitou o dinheiro. Já suas irmãs brigaram por coisas mais valiosas que a bisa tinha deixado: jóias. Foi ridículo, vergonhoso.
ResponderExcluirEnfim, texto reflexivo e excelente temática, é o que mais vemos entre nós, numa perda. É mais que desrespeito.
Beijos
Tais, querida amiga, que texto hein, mexeu com meu coração literalmente, pois ainda estou passando por alguns momentos semelhantes. e, as lágrimas insistem em aparecer. A depressão , a qual a gente custa a reconhecer, a vontade de ficar só na cama, a dor em saber que tudo está sendo carregado por quem nem merecia estar ali, coisas da vida ou coisas da morte.Seu texto veio para me dizer:- Chega , Marli....segue ...a vida continua até que sua vez chegue. Obrigada, minhas lágrimas continuam ,mas vão cessar com certeza. Grande beijo!
ResponderExcluirMarli querida:
ExcluirCertamente que as coisas vão se ajeitando e você vai sentir, cada vez mais, que a vida precisa seguir seu curso. E para isso precisamos reunir todas as nossas energias e tentar ver o lado bom da vida. Apesar dos sofrimentos que temos de passar, a vida é um milagre maravilhoso, e um presente!
Beijos, meu carinho, amiga.
Já passamos por isso e o falecido nem tinha sido enterrado e as pessoas estavam na casa dividindo o que dava para dividir e não precisava da justiça. O resto que dependia de inventários e tudo mais foi disputado a unhas grandes. Graças a DEUS meu pai ficou de fora dessa briga e hoje sabe o quanto isso lhe fez bem...
ResponderExcluirè muito triste isso mesmo, minha querida, mas essas mazelas fazem parte da VIDA e o ser humano, na maioria das vezes é DESUMANO!!
Beijinhos...
Perfeita descrição deste momento inevitável com todos os sentimentos envolvidos desde o fato ao desenlace final das ultimas lembranças.
ResponderExcluirA saudade é a herança mais longa e sofrida, que nem sempre se parte e ou compartilha, a dor é sua e só voce sabe como gerencia-la até que a dor não punge e se transforma numa gostosa lembrança.
Meu pai tinha uma concepção de que durante um velório, era claro para ele duas situações: O idiota que fica chorando e o esperto que fica abrindo as gavetas e catando os ouros e pratas.
É tal festa e solidão sempre juntas.
Muito bom texto e reflexão e que a nossa seja leve Taís.
Carinhoso abraço amiga.
Bjo de paz e luz.
É assim mesmo, "sem tirar, nem por". Parece-me que o ideal seria não se deixar bens materiais para partilhas. Já vi muitas famílias se "desfazerem" depois da morte do patriarca ou da matriarca, é muito raro que isso não ocorra. Sua crônica retratou bem o que se passa com a morte de ente querido.
ResponderExcluirUm abraço, Tais,
da Lúcia
Querida Tais: Magnífica narración sobre las diversas etapas vividas por los familiares ante el fallecimiento de un ser querido.
ResponderExcluirLo “lógico” es que los diversos periodos fluyan como los describes en tu escrito, dándonos a conocer la naturaleza del ser humano.
Hay otras ocasiones en las que podemos ver como, nada más fallecer (con el fallecido aún presente) se produce una explosión en la familia, comenzando la guerra para conseguir la mejor “tajada” del reparto de bienes materiales. Estas actitudes no solo se producen ante el reparto de una gran fortuna, sino que surgen para conseguir pequeñas cosas materiales como algún mueble u objeto sin un gran valor económico. Es el momento que de forma clara expresamos nuestra verdadera pena por su desaparición.
El ser humano es imprevisible en sus reacciones con las que muestra sus verdaderos sentimientos.
Un fuerte abrazo
Uma perda é sempre terrível. Muitas das vezes devíamos estar
ResponderExcluirpreparados para tal,mas é algo que não sucede.
Gostei do seu texto e da imagem.
Desejo que esteja bem.
Bj.
Irene Alves
Você abordou realidade em sua crônica, caminhando pelas etapas que sucedem o falecimento de alguém. Enquanto a dor é latente e a saudade envolve, há clima de harmonia e solidariedade. No momento da partilha, ainda que o espólio contenha poucos bens, os indivíduos tiram as máscaras e começam uma luta insana e, a meu ver, indigna. Porque se briga tanto pelo que, na maioria das vezes, não se ajudou a construir? Grande beijo!
ResponderExcluirMuito bem escrita sua crônica Tais. Fico imaginando como a tristeza que antes era digna de piedade, é tomada pela fúria, pela guerra, e os olhares antes molhados de lágrimas se tornam olhares de lince objetivando ganhos dispostos ao ataque para alcançá-los. Os sentimentos mudam quando a perda passa a ser uma forma de ganho e infelizmente isto é o que mais se vê.
ResponderExcluirFamílias que antes pareciam unidas se desmoronam por conta dos bens materiais.
Quero te agradecer pelo comentário lá no blog e retribuir os votos de Boas Festas, desejando a você também muita paz, saúde e alegria. Bom Natal e um Ano Novo de muitas realizações.
bjs.
Após a perda dos meus pais eu vivi a sua crônica. É triste!
ResponderExcluirTaís: excelente como sempre. Um grande abraço. A musa manda beijos
AOS QUERIDOS AMIGOS:
ExcluirRC
Santa Cruz
JairCLopes
Celia Rangel
Magui Só
Chica
Jair Machado Rodrigues
Marly de Bastos
Fábio Murilo
Vilma Piva
Rute
Néia Lambert
Luis Fellipe Alves
Marli Terezinha Boldori
Malu Silva
Toninho
Lúcia Bezerra de Paiva
Amelia
Silenciosamente ouvido
Marilene
Lourdinha Vilela
Antonio Machado
Um grande abraço a todos!
Com meu carinho.
TL