31 de janeiro de 2008

OS EMERGENTES

Tamara de Lempicka


- tais luso de carvalho


( crônica republicada em fevereiro de 2011:  veja aqui  Com os comentários).

É muito divertido de se ver as extravagâncias dos novos-ricos. Mas o mais curioso é que alguns emergentes nos dão a impressão de que tudo o que ostentam vem de berço, como se eles fizessem parte de uma dinastia. Tudo muito natural. Sendo assim, a coisa fica bastante animada. E essa migração, de uma classe social para outra, chama muita atenção.

Os cachorros dos novos-ricos frequentam manicura, pedicura, tosa e modelista. As fêmeas andam de fitinhas e gargantilhas de strass. E se forem pequeninos andam no colo, aquele lance de nenê da mamãe.

A casa do novo-rico tem de ser top: recebe a visita de um decorador - já conhecido no mundo das celebridades - para decorar a nova morada com muito luxo. E começa por cavar uma piscina, com um belo jardim para sair na revista Caras, com a patroa no seu melhor modelito.

Os Novos Ricos está na Revista Voto

do mês de jan / fev de 2011

As empregadas domésticas entram na goma: uniforme dos pés à cabeça, passam a falar baixinho e adquirem um comportamento misterioso, principalmente ao telefone: falar com a patroa torna-se algo mais difícil do que falar com o Ministro das Comunicações. Mas faz parte, a madame é muito ocupada.

Bom gosto não se compra com dinheiro, e por isso se vê tanta extravagância. Os velhos amigos voam! Os novos-ricos têm interesses diferentes: um deles é explodir como mais uma socialite nos céus desta pátria amada / idolatrada / salve, salve...

Para os homens valem outras coisas, mas não menos engraçadas: o belo carro top, com duzentas luzinhas no painel - que lembre a cabine de um Boeing 777 - deixa os novos emergentes alucinados. Após o carango supersônico, entra no esquema o laptop mais avançado do mercado; um celular afinadíssimo; caneta de ouro; relógio Rolex, Patek Phillipe... E bebida! E na bebida, a maior exigência fica por conta do vinho. E o bom emergente faz questão de anunciar o preço de seu vinho... Aliás, fazem questão de gritar o valor de tudo. É um problema de status, prestígio.

O emergente metido a enólogo, tem um envolvimento com o vinho como se fosse a sua eleita, e fica aloprado ao entrar numa adega. Para alguns deslumbrados, o vinho tem de ser degustado e seus mistérios desvendados! Olhem que coisa romântica... O ritual do vinho só perde para o chá dos japoneses - com cinco horas de preparo. Beber com um emergente nunca será um prazer, será um estresse.

Mas, continuando com as originalidades dos emergentes, a temperatura do vinho tem de ser exata: o excesso de temperatura poderá deixar o vinho agressivo, pouco agradável, como o inverso fará com que o vinho adormeça, neutralizando o aroma e sabor. (Nossa...)

É da maior importância que o vinho seja da melhor safra, da uva tal, e conhecer a vinícola - procurada alucinadamente no rótulo da garrafa. Faz parte da cultura geral.

Mas tem mais: o melhor cálice é o de cristal sem emenda - liso e com silhueta de tulipa - para poder girar o vinho, feito carrossel mexicano. Isto fará o vinho respirar e soltar os aromas. E assim ser cheirado inúmeras vezes. Estão entendendo o espírito da coisa?

Então sigo...

A idade do vinho é importantíssima: sendo vermelho rubi, é um vinho jovem; vermelho acastanhado, vinho mais envelhecido. Então você decide se quer um 'véio' ou um novinho, frutado ou com gosto de madeira.

Você tem de amar o vinho! Ser-lhe fiel! Beber pensando nele: sentir se é encorpado ou leve; se generoso, aveludado, rascante... Mas se for um vinho filante (doente), o cara tem um ataque! O estudo técnico de um vinho é como um Processo de Software. É muito importante, você precisa entender isso; faz parte da nova personalidade dos emergentes.

O vinho sempre será algo de extrema importância nos bate-papos: prepare-se para uma aula sobre as uvas sauvignon, merlot, pinot noir, pinotage, chardonnay, gewürztraminer... E o negócio vai longe, pois falar na rolha, no sabor, no perfume, na uva, na cor, na acidez, na idade, de onde veio é coisa pra muitas horas. Porém, não repare se o emergente ficar de olho na garrafa feito cão de guarda... Faz parte.

Espere mais um pouquinho que talvez você descubra o sexo da bebida, uma vez que uva é feminino e vinho é masculino. Mas então é isso aí, gente; foi só uma introdução pois o assunto é infinito. As extravagâncias são inúmeras, pois marinheiro de primeira viagem comete estas coisas meio esquisitas.

Os homens não compram uma Louis Vuitton , não enfeitam os cachorros, não colocam uniforme nas empregadas, não enchem a casa de cristais, mas quando emergem ficam loucos por coisas que ninguém entende. Até por uma taça de tulipa, sem emenda!

Mas no final, tudo isso é a cara do Brasil; e a gente acaba entendendo. Mas o que vale é que os novos-ricos devem se divertir um bolão; e nós também!



5 comentários:

  1. Haha Tai o que eu sempre quis dizer e nunca disse! Bjx

    RF

    ResponderExcluir
  2. Sei lá como cai aqui, mas achei esplêndido este texto, Tais! Concordo 100% com cada uma das tuas considerações perspicazes, precisas e cheias de humor elegante.
    Parabéns! Frequentarei.

    Sds,
    Cesar Cruz
    (escritor também)

    Vila Mariana
    S.Paulo/ SP

    ResponderExcluir
  3. Anônimo12:26

    Gente, eu tenho um tio milionario, Carlos Turola, nas festas bregas que ele da, cada um leva um prato, nos aniversarios, nao da nem parabens pra nao gastar rssssssssdiculusssssssss



    Kel

    ResponderExcluir
  4. Tais,
    Maravilhoso!
    Tenho uma amiga que,escrevia sobre os emergentes e novos-ricos, pois ela é de família tradicional. Agora retornou ao Brasil e perguntei se escreveria novamente. A resposta dela foi a seguinte: - tenho que tomar muito cuidado, pois agora a Lei é dura para discriminação e o nome correto não é novos-ricos e emergentes, e sim "Comunidade Ascendente Social Deslumbrada"! Achei hilário!

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Oi, Lena, nunca tinha escutado isso, é hilário, mesmo! Só me falta esse pessoal se achar discriminado!
      Beijos pra você, volte sempre.

      Essa crônica está num outro link, acho que você não viu...Em AZUL,lá em cima, no começo!

      Excluir


Muito obrigada pelo seu comentário
Abraços a todos
Taís