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Tais Luso de Carvalho
Recebo
algumas mensagens daquelas tipo
reflexivas, acompanhadas sempre de fantásticas paisagens,
fotos etc e tal. Vendo o maravilhoso vídeo, me dá é uma enorme
vontade de virar uma Santa para não ser uma desprovida de compaixão,
de solidariedade, de resignação de amor ao próximo, de virtudes
inatingíveis para seres normais. Mas não é assim, estilo 'leu e
bateu'; 'bateu e modifica'. Sou normalzinha. As coisas têm seu
tempo.
Abro
a porta, alcanço a rua e a realidade é outra, sem efeitos especiais. E o problema está ali, bem próximo, nas pessoas, nas
calçadas, nos atendimentos médicos, nos hospitais... Mas alguns vídeos
são diferentes, jogam belas palavras acompanhadas de sonhos. Como se tudo se resolvesse num clicar de dedos. Nunca.
No
meu bairro apareceu um morador de rua que chamou muito
minha atenção. Ontem, ao levarmos nosso cachorro para seu
passeio, passamos por esse mendigo que ficou olhando, sorrindo
para nosso cão, dando-lhe um Buenas, amigo! Foi um bom
dia pra lá de gauchesco: forte, firme e com sotaque da
fronteira. Achei até bonito!
Mas
no início senti algo de estranho naquela atitude, uma postura um
pouco diferenciada do mendigo. Senti, de imediato, a sensação de
que o homem virou mendigo há pouco tempo. Não apresentava a
humildade dos desprovidos nem a arrogância dos abastados. Mas algo ficou
no ar.
Cabelo
e barba já revelavam certa idade, embora se mostrasse um mendigo
desempenado. Com uma voz forte, deitado sobre um cobertor, trazia
entre seus pertences uma cuia de
chimarrão. E ainda o humor para dar um Buenas
personalizado.
Continuamos
o passeio, mas eu, com o mendigo na cabeça. Na nossa volta, ele
sorriu novamente pro cachorro de corpo grande, baixinho, peludo,
bem tratado e com uma capa de chuva!
Realmente,
o quadro era engraçado (ou
desgraçado?). Estava chovendo: e um mendigo sem
proteção, deitado debaixo da marquise, enquanto um cachorro passava com capa
de chuva... Na hora senti o desconforto
da situação.
Num
dado momento, o mendigo
gaúcho levantou-se para pegar uma mochila, mas não conseguiu
caminhar sem a ajuda de uma velha bengala. Custou a dar 5 passos...
E Pedro, meu marido, ajudou o homem a pegar sua mochila que estava
mais adiante.
Com
seu sotaque forte e bonito, o mendigo agradeceu e falou para Pedro:
-
Olha, amigo, vou lhe dar um
conselho: nunca beba ou fume... fuja disso, fuja!
Nada
perguntamos; nenhum dos porquês foi acionado. Mas lá no começo eu
tinha sentido que havia algo bem diferente com esse mendigo.
Talvez
um dia a gente venha a saber o porquê! Por enquanto conhecemos
apenas o seu Buenas,
acompanhado de um sorriso diferente. Tão guapo
como sua saudação.
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Querida Tais,
ResponderExcluirMuito linda e triste a sua história da vida real...a vontade que me dá é de ir aí,conversar com o "seu" mendigo, procurar saber o que existe por trás do BUENAS e do sorriso para o seu cão...mas acontece que seria muito invasivo de minha parte, reconheço, e a melhor atitude foi a que você e seu marido adotaram.Aqui nesta serra onde habito(há dois anos)vejo vários tipos assim, curiosos e diferentes, mas este seu me despertou mais a curiosidade (que não é pequena,posso lhe afirmar). Espero que o veja novamente e venha nos contar uma bela história.
Bjssssss,
leninha
Oi, LENINHA, pois é, esse 'meu' mendigo (como você disse rsrs) me deixou inquieta, e desde o princípio eu desconfio... Acho que ainda vou saber alguma coisa. Como disse no texto, ele não tem a humildade dos desprovidos nem a arrogância dos abastados. Mas algo ficou no ar. E o conselho?? Faz pensar, não?? Esse foi o meu ponto de partida. E quantos desses estão na rua?
ExcluirGrande beijo, volte sempre.
Limerique
ResponderExcluirMaioria das pessoas ao ver mendigo
Apresenta atitude de "eu nem ligo"
Mas ali um ser humano
Em estado draconiano
Que traz o peso dos erros consigo.
Oi, JAIR, você disse muito bem, 'que traz os erros consigo'. Por que aquele conselho dado de uma maneira de quase réu confesso, não é?
ExcluirAdoro seus 'limeriques': você diz muito, e com poucas palavras!
Grande abraço, amigo.
Olá, Taís!
ResponderExcluirEssas mensagens coloridas, belas, inebriantes em seus apelos aos nossos sentimentos, lembranças, sonhos...! Já nem as reenvio ou salvo! Vejo-as, admiro-as, reacendo minhas vontades (seja a de ser um ser humano melhor ou de viajar por aquelas paragens) e só. São o que vc lucidamente disse: momentos.
O "seu" mendigo é real. Está lá a exibir as diferenças (o cão e o homem). E o que se faz ou não com ele, como com tudo, inclusive com as mensagens que nos reclamam posturas solidárias. Questões do olhar.
Meu lado romântico viajaria: esse mendigo não é um anjo materializado a trazer uma mensagem? Ah, são vastas as possibilidades.
Muito boa a sua crônica, de ler, pensar e viajar!
Bjsssssssssssssss, quérida!
Querida BRECHIQUE, essas mensagens por email mexem com meu lado curioso: ver paisagens, pinturas, cidades, etc. Mas não têm o poder de me emocionar pois são cobertas de fantasia. E fantasia não me emociona. Sei que existe ali um brilho falso. Porém, o que vemos na realidade, pode ser muito pior do que imaginamos. E o real é que emociona, seja ele belo ou triste, como vi.
ExcluirGrande beijo, amiga!
Ah, não sei, não. Fiquei curiosa em saber a história dele. Talvez tudo que ele precise é de alguém para ouvir. Nós vivemos numa sociedade em que tudo nos assusta. Você vai viver com essa dúvida?
ResponderExcluirBeijo grande!
Oi, ROVÊNIA, também estou curiosa, quem sabe um dia ele não pegue confiança... E será que quer falar? O que será que se passa por detrás de um morador de rua? Que eles vivem e convivem com o medo, não tenho dúvidas. Nossas ruas, bairros estão cada vez mais tomados por esses abandonados e excluídos.
ExcluirBeijo pra você, amiga.
Que coisa maravilhosa..Aparecem mendigos disfarçados de anjos ou vice-versa. Lindo e tocante! beijos,chica
ResponderExcluirTais,
ResponderExcluirFiquei emocionada com sua crônica! Ela traz a força e o desconforto da realidade que vivemos e que, muitas vezes, fingimos que não vemos. Refiro-me ao mendigo abrigado debaixo de uma marquise que saúda o cachorro que passa com capa de chuva. Por que nos sentimos desconfortáveis em nosso relativo luxo, como se fôssemos culpados de algo? Como se fosse nossa obrigação abdicar do que temos em favor do outro - lembrando que são milhares os desprovidos... O interessante é que focamos no material que falta ao outro, porém, será dessa natureza sua maior carência? Talvez o conselho do mendigo nos dê uma pista daquilo que realmente falta: sabedoria para administrar as escolhas! Sabedoria para lidar com situações adversas... e essa, a sabedoria, não se compra nem com o melhor dos salários! Mas se adquire através de experiências com a sua, tão bem relatada nesta crônica.
Você foi sensacional, fiquei com uma imensa vontade de conhecer "seu" mendigo e ouvir seu "buenas" tão peculiar. Só não garanto que eu teria sua discrição, acho que sairia de cara acionando os porquês! rsrsrs Beijo.
SUZY, é isso que você diz: sabedoria pra administrar nossas escolhas. E você também toca em culpas. E é o mais difícil. Não sei por que dizem que tudo é culpa da sociedade. Resumindo, todos nós temos culpa por toda a pobreza que caminha pelas ruas, mas o Estado nunca se culpa. Que culpa temos pelos deslizes dos outros? É triste, muito triste, mas não é culpa da sociedade; é culpa do Estado que investe muito pouco em educação – a mola para uma sociedade melhor.
ExcluirNesse 'quesito', nosso Estado aparece entre os piores. Então é uma bela maneira de cair fora das suas responsabilidades. Há anos que tudo de ruim vem se multiplicando, e a galope! Você que trabalha na área, sabe.
Você mostrou a vontade de 'sabatinar' o 'meu' mendigo. Vendo, você mudaria de ideia... Ele coloca barreiras invisíveis.
Beijos, querida.
Oii Taís, que coisa, como é a vida né, nunca sabemos o dia de amanhã, esse pobre e ao mesmo tempo forte mendigo pode ter sido um homem de vida comum que se perdeu no álcool e agora mendiga pelas ruas, uma pena! Bjoooss
ResponderExcluirTemos medo de nos aproximar, de nos envolver, e depois vem aquele ditado:" Se tornas eternamente responsável por tudo aquilo que cativas."
ResponderExcluir(do autor de O Pequeno Príncipe -Antoine de Saint-Exupéry),e então ficamos sem nada fazer,sem conhecer os motivos que levaram tais pessoas a à esta condição na vida.Quem saberia a sua historia, ,atropelos e fracassos.; Fica apenas o sinal:" ? "
Belíssima crônica Tais.
Grande Abraço.
Vengo del blog de vanuzamatagal y me ha encantado tu Rincón; por lo cual, si no te importa, me gustaría ser Seguidor de tan bello Espacio, lleno de Magia, Sentimientos y Sensaciones.
ResponderExcluirUn abrazo.
linda historia... encontros sao assim, cheios de surpresas. com suas reservas... e raios.... por vezes a sabedoria da vida abraça certos homens... simplesmente por serem homens... abraços lamarque
ResponderExcluirO caminhar com sensibilidade causa isto né Tais?
ResponderExcluirA sensibilidade de ir alem de nossos olhos.Analises, interpretações e ensaio de ações.Acho isto muito lindo na pessoa.
O homem, sua vida e sua historia lançado numa rua com sonhos despedaçados e ainda se auto analisando e aconselhando.
Bela partilha amiga.
Boa semana de paz e luz.
Meu abraço.
Simplesmente você se viu uma caminhante e não um pedestre. Continuas escrevendo muito bem.
ResponderExcluirCHICA, KELLEN, LOURDINHA, LAMARQUE, TONINHO, ANTONIO...
ResponderExcluirUm grande abraço! Agradeço pelas palavras!
(aos demais já respondi.)
Una anécdota que conviertes en un precioso relato con tu estilo y elegancia. Un saludo, amiga
ResponderExcluirVocê é muito talentosa, incrível como você escreve bem, envolvente como vc pinça fatos e faz um enrolado nas tuas vivências aproveitando para nos falas das coisas, das pessoas, que para muitos passaria batido, talvez a razão esteja nos porquês que vc diz fazerem partes da tua fala e do teu jeito, não passas em branco pela vida, não, e assim vasculhas labirintos e nos entregas muita luz, tudo fica normal, faz parte da vida...eu amei ler, super parabéns.
ResponderExcluirOlá, EVA, muito obrigada por suas palavras. Na verdade trago e exponho meu cotidiano e minha visão sobre as coisas como se estivesse conversando com amigos, apenas deixo minha sensibilidade falar. E gosto da simplicidade para dizer o que vejo. Esse blog é o meu 'Diário'.
ResponderExcluirMuito obrigada pelo seu carinho.
Beijão, amiga!
" ... senti algo de estranho naquela atitude..."
ResponderExcluirTais (sem acento porque já li lá no layout, teu belo nome sem o dito cujo), querida Tais!
Várias leituras tem essa crônica, mas vou ater-me ao "conselho" que o mendigo deu ao teu esposo: "- Não fume, não beba!"
Esse homem detinha uma sabedoria que transbordava da sua miserabilidade exterior e você, mulher, sensível, artista, dela se impregnou como que por osmose, foi direto ao coração.
Se fôssemos generalizar, constaríamos que mendigos somos todos nós. Crianças de classe média com seus tablets nas mãozinhas rosadas - aí entra a história do sucesso enorme da tecnologia digital - todos virados com as faces para a radioatividade dos seus pcs, notebooks, etc. e tal. Quem irá querer virar a face para o seu semelhante? Mesmo adultos e "realizados", mendigos de afeto seremos para sempre.
Falando aqui em casa há pouco tempo, disse:- Pois é, sou do tempo em que saíamos pra passear nas ruas e olhávamos vitrines, víamos as situações interessantes nas ruas, cumprimentávamos algum conhecido. Hoje, pessoas falam em tom de voz alta em seus celulares modernos.
A tecnologia avança, a alma humana se encolhe. Puxa, e eu ainda insisto em ser otimistta.
Amiga, obrigada por ter-me dado a grande oportunidade para tecer essas reflexões. Você é um anjo! Beijinhos... [vou dar uma passadinha lá no seu espaço artístico, tá?]
VANUZA, querida, você disse muito:
Excluir'A tecnologia avança, a alma humana se encolhe. Poxa, e eu ainda insisto em ser otimista.'
Penso exatamente isso, hoje em cada esquina há um morador de rua.
E atrás de cada morador de rua tem uma história triste e uma vergonha que o acompanha, não por culpa nossa, não podemos nos culpar por tudo o que acontece de ruim aos outros. Não cabe a mim dizer de quem é a culpa: às vezes do sistema, do Estado, da própria família ou da própria vítima.
Só sei que os caminhos vão sendo feitos. Caminhos que causam compaixão, acima de tudo. Ninguém nasce para ser infeliz.
Obrigada a você!
Beijos, querida.
ResponderExcluirOlá Tais,
Realmente, as mensagens que recebemos por email são fantasticamente lindas em palavras e roupagens, diferentemente do que se observa a olho nu, mas sempre deixam algo que penetra nosso coração.
Como você mencionou, às vezes nos sentimos desconfortáveis por termos um conforto "a mais", quando o próximo nem mesmo tem o necessário. Mas, infelizmente, a vida é assim. Cada um colhe conforme plantou. Mas é nosso dever cristão estarmos atentos para ajudar e fazer a nossa parte sempre dentro do possível e dos princípios cristãos da caridade e da solidariedade.
Este mendigo, com certeza, pelos conselhos que deu, está sendo vítima dos excesso que praticou. Quem sabe?
Adorei ler.
Beijo.
Olá, Vera, ótimo tê-la aqui! É isso, sem dúvida, o que terá acontecido para aquele conselho... Você falou bem. Acredito que se as pessoas pensassem um pouco mais no valor de suas vidas, poderiam evitar muitas coisas.
ResponderExcluirGrande beijo, querida.
Tens razão querida! Palavras lindas aquecem a alma e nos fazem refletir, mas a mudança é resultado de uma série de circunstâncias , de oportunidades e sobretudo da vontade firme de querer.
ResponderExcluirBelo e sensato conselho do morador de rua! Quem sabe o conselho nasceu da sua experiência negativa.
Meu coração se prostra diante desta realidade que nos desconforta quando confrontados.Não somos os salvadores do mundo, mas podemos fazer nossa parte e isto pode significar a diferença.
Bela crônica!
Brisas e flores para você.Bjs. Eloah
professores educadores em sala de aula ou não:, Pais, Artistas, Artesãs, Poetas, Escritores(as), Culinaristas,Evangelizadores, Blogueiros( as), em fim, todos que ensinam e educam merecem no dia 15 de outubro ser homenageados(as).
ResponderExcluirUm autor desconhecido escreveu assim:
" Educador, como ninguém, você exerce com maestria essa função. Você professora.,já foi criança e... ontem você não entendia muitas coisas, hoje precisa se fazer entender, criar soluções. No seu dia-a-dia a sua capacidade de amar é colocada à disposição de todos. Quando você volta para casa, a tarefa ainda não está terminada, mas a sua consciência está em paz. Você corre em paralelo com o tempo para não ficar ultrapassado. Aceita-se todo por dentro para mostrar a seriedade que é exigida e ainda sorrir para aqueles que precisam de afeto. Na sua angústia existencial ainda se propõe a ajudar a quem procura. Você avalia. Que coisa difícil é avaliar. Aprova , reprova e finalmente recupera. Pelos caminhos da sua vida você vai encontrando tantas portas.....umas quase se fecham, quando deveriam se abrir. Tantas que se abrem, quando deveriam fechar-se, Portas sombrias, enferrujadas, à espera de alguém ansioso por um toque, outras escancaradas pela falta de responsabilidade e amor. E você, passo a passo, vai contribuindo para cada uma delas. Você transforma, ilumina, esclarece, compreende e vence o desafio. É o suave mistério da sua vocação. Como você é importante!!!"
Ser professor não é um dom é uma escolha e se escolhemos exercer esta profissão devemos cumprir com amor, dedicação e preparo, está sempre disposto a aprender.
Como diz Paulo Freire: “Ensinar não é transferir conhecimento, mas criar as possibilidades para a sua própria produção ou a sua construção”.
Feliz dia do professor e muito sucesso cada dia da tua vida! Abraços da amiga Lourdes Duarte.
Parabéns pelo sei blog, Tais. Os textos são leves, mas não sem levar sempre a uma reflexão. Muito bom. Continuarei por aqui!
ResponderExcluirCada vez que vejo alguém deitado na calçada fico imaginando o que o levou a essa "vida". Nem todos têm aparência assustadora. Se essas mensagens (e são muitas) que recebemos tivessem seus conselhos sendo seguidos por quem as envia, creio que a solidariedade estaria mais presente entre os seres humanos. Há textos que nos deixam tão sensibilizados! Mas basta estar na rua para encontrarmos uma realidade de frieza e indiferença. Bjs.
ResponderExcluirOlá Taís,
ResponderExcluirgostei muito da crônica. A mesma simplicidade da proposta condiz com o conteúdo: aí se vê o pequeno e o grandioso. Bonito é ver que a derrocada do mendigo não foi espiritual ( ele não deseja o mal para os semelhantes, ao contrário, os aconselha para que não encontrem a desgraça nos vícios que certamente lhe fizeram tanto mal )
Um grande abraço, Loyde manda beijos
Oi, ANTONIO, ótimo ter você aqui. Pois é, já no começo me pareceu bem diferente, mas, após o conselho... fechou com que havia pensado. Um mendigo bem diferente... Eu, na verdade, não o acho mendigo. E por vários aspectos.
ExcluirBeijos a vocês todos! Obrigada.